O ano era 2005, quando houve a criação do Programa de Inclusão Digital, por meio da Lei nº 11.196/2005, especialmente com o objetivo de incentivo à inovação e desenvolvimento, além de ampliar o acesso a produtos tecnológicos à população. Em seu Artigo 28, previu que ficariam “reduzidas a 0 (zero) as alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins incidentes sobre a receita bruta de venda a varejo”, benefício concedido com prazo certo.
O disposto no inciso II, do Artigo 30, da referida lei, dispositivo que faz referência aos seus Artigos 28 e 29, foi sendo modificado, cronologicamente, por diversos regramentos, da seguinte forma: Pela redação original, teria aplicação às vendas efetuadas até 31 de dezembro de 2009; com a Medida Provisória nº 472, de 2009, aplicar-se-ia às vendas efetuadas até 31 de dezembro de 2014, data mantida com a Lei nº 12.249, de 2010; prazo ampliado mais uma vez pela Medida Provisória nº 656, de 2014, e pela Lei nº 13.097, de 2015, até 31 de dezembro de 2018.
Assim, as empresas inseridas dentro dos parâmetros dessa legislação vinham considerando a alíquota 0 (zero) para as contribuições do PIS e da COFINS, cuja previsão, conforme se constata pela evolução cronológica e legislativa acima, parece ter adquirido um nível de estabilidade de tal forma que a sistemática se incorporou às suas operações, com prazo sempre fixado legalmente para seu término, garantindo uma previsibilidade transparente na tributação.
No entanto, em 2015, a indústria e o varejo foram surpreendidos com a publicação da Medida Provisória nº 690, de 31 de agosto daquele ano, a qual, em seu Artigo 9º, revogou o benefício em questão, entrando em vigor na data de sua publicação. Em seguida, a MP foi convertida na Lei nº 13.241/2015, que estabeleceu, pelo menos formalmente, a definitividade da revogação do benefício fiscal de alíquota zero.
Ocorre que a referida revogação tomou de surpresa o contribuinte, que tinha amparo em legislação e previsão de manutenção do benefício pelo menos até 31 de dezembro de 2018, por força da renovação de prazo do Artigo 5º da MP nº 656/2014, convertida na Lei nº 13.097, de 19 de janeiro de 2015.
Portanto, a mudança brusca feriu preceitos fundamentais do ordenamento jurídico brasileiro, entre eles aquele contido no Artigo 178 do Código Tributário Nacional.
STJ entende antecipação da revogação da Lei do Bem como ilegal
Foi com esse fundamento que, ao apreciar três ações sobre a matéria, a maioria da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu pela ilegalidade da revogação (3 votos a 2).
Conforme o órgão julgador, a medida ofendeu o Artigo 178 do CTN, que diz que “a isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo”. O julgamento, concluído na última terça-feira, dia 08.06.2021, teve início em dezembro de 2020 e, após quatro sessões e dois pedidos de vista, foi definido por desempate pelo ministro Sérgio Kukina.
Apesar de não ter se dado ainda pela sistemática dos recursos repetitivos, e, dessa forma, não constituir entendimento consolidado e de aplicação automática a todas as demandas que versam sobre a mesma matéria, o posicionamento da 1ª Turma aponta para o caminho da compreensão dos critérios e finalidades da lei, que, como destacou o Ministro Sérgio Kukina, no julgamento, não comporta a distinção entre varejistas e industriais para a fruição do benefício, inclusive porque o objetivo é beneficiar o consumidor, na ponta final da cadeia de produção.
Por Gleirice Machado Schütz, Advogada na Machado Schütz & Heck Advogados Associados.
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